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Tracy Vandal: «Saí para a rua com a neve, com o baixo acústico e o meu computador e gravei o disco»

©Francisco Fidalgo para o MYWAY

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Tracy Vandal: «Saí para a rua com a neve, com o baixo acústico e o meu computador e gravei o disco»

O nome Tracy Vandal poderá não vos soar de todo estranho, especialmente se as memórias dos Tiguana Bibles ainda se mantiverem vivas. «The End Of Everything», o primeiro EP a solo da voz do quarteto rock de Coimbra, não fala sobre o fim da banda em 2012; aborda antes temáticas negras, intrínsecas à artista que as compôs numa noite gelada de esperança. Um registo pessoal, que compila histórias e experiências debaixo de um negrume de vozes e instrumentos a saber a Chelsea Wolfe. Com a ajuda de Boz Boorer, histórico guitarrista de Morrissey, Tracy Vandal recomeçou o seu percurso musical em nome próprio, banhando os seus temas originalmente tristes e acústicos de electrónica, reinventando-os como temas pujantes e, ao mesmo tempo, introspectivos.

Em oposição ao que transmite no álbum, uma simpática e animada Tracy Vandal ofereceu-nos uma boa hora de conversa onde falou abertamente sobre os dois anos de aparente ausência, sobre o período de isolamento que levou ao disco e sobre os projectos que tem para breve.

 

Como é estar de volta à música?
Tracy: Eu não parei mesmo de fazer música. Só que o disco demorou tanto tempo a sair, que entretanto – isto porque eu também estive a tocar com os A Jigsaw – as pessoas não percebem que eu estou sempre a fazer alguma coisa. E cada vez que eu toco com os A Jigsaw eles dão-me duas novas músicas para aprender, e mais duas, e entretanto tenho estado a trabalhar no Porto Alegro com um rapaz chamado Miranda, que faz som, vídeos, e tem outra banda, os Wild North. E teoricamente ele vai fazer parte da minha banda principal com outro rapaz, um expert em computadores. Quero fazer isto resultar com o máximo de pessoas possíveis, para conseguir meter toda a gente no mesmo carro e para podermos fazer dinheiro para variar, em vez de só gastar!
Eu não parei, mas isto levou dois anos, porque aqui toda a gente diz ‘amanhã’, ‘amanhã’, e depois adoeci também e pedi-lhes para adiarem o disco, mas eles lançaram-no à mesma, por isso estou a tentar relançá-lo agora em Dezembro! Mas não foi de todo a maior pausa que eu tive. Quando tive filhos parei durante dez anos! Era personal trainer e morava em Londres e quase não cantava. Depois fiz uma banda chamada Lincoln, e safámo-nos muito bem, tocámos no Queen Elizabeth Hall, em Londres, costumávamos esgotar as salas, costumávamos ser a banda de apoio dos Calexico, e dos Thindersticks e dos Lambchop, e todos este tipo de bandas americanas. Mas os gajos da minha banda eram todos mais velhos do que eu e tinham 180 filhos entre eles e eu só tinha 24 anos na altura.

Comparado com os Tiguana Bibles, tornaste-te mais pessoal neste EP?

T: Sim! Eu escrevi-o por acidente. Foi em Novembro de 2012. Eu tinha cancro on&off durante três anos e estava bem, e de repente a quimioterapia começou a ter efeitos secundários… Os meus ossos começaram a ter osteoporose, e tomava muitos comprimidos, começaram a encontrar coisas erradas com o meu sangue, fiquei incuravelmente anémica… E fiz esse disco numa só noite, aparte de uma das canções, que escrevi em Glasgow. Estava completamente fora da minha cabeça e o meu irmão e a mulher não me deixavam tocar em casa e só tinha um baixo acústico e estava a nevar – e quando tu tens uma ideia para uma canção tens de a tocar – por isso saí para a rua, com a neve, com o baixo acústico e o meu computador com uma cobertura por cima, e gravei o disco. Claro que depois voltas ao disco e fazes mais e mais gravações. E depois veio o João Rui (dos A Jigsaw) e pedi-lhe para me ajudar a fazer os arranjos das canções e ele fez um trabalho fantástico. Não mudou demasiado, mas mudou o que devia ser mudado. E depois, por mero acaso, Boz Boorer (guitarrista de Morrissey) tem um estúdio em Monchique – aliás, ele comprou a aldeia – e tem lá uma casa incrível com a mulher dele e gravam lá bandas, e fazem o pequeno-almoço, o almoço e o jantar para toda a gente, há um frigorífico com tudo aquilo que possas querer beber, estás completamente isolado, portanto tudo o que tu podes fazer é trabalhar e é uma atmosfera muito boa. E ao meio-dia tens de te levantar e trabalhar e páras à meia-noite e depois – como ele é um gajo do rockabilly – metíamos a música aos altos berros, pegávamos nas garrafas de medronho e rock’n’rollávamos nas montanhas com toda a gente bêbeda! Isto porque lhe liguei para saber se havia a possibilidade de gravar com ele e ele disse-me ‘por acaso estou preso aqui por quatro dias, porque perdi o meu avião. Consegues vir aqui ter hoje?’ e eu disse que sim! Sem o Boz tinha sido impossível fazer este disco. E o Paulo Trindade também foi uma ajuda importantíssima, porque não me cobrou pelas fotos e porque elas tiveram imenso impacto.

Na descrição do EP falas num período de isolamento em que compuseste o disco. Achas que, se não estivesses nessas circunstâncias, este disco teria sido lançado?

T. A… Não. Não da forma que saiu. Porque todas as canções falam sobre estar isolada ou sobre morrer, ou sobre querer morrer, sobre não querer lidar com mais… vida. Não é suicida. E especialmente a última música é uma mistura de histórias. Não te vou dizer sobre quem é, porque é uma mulher muito famosa, mas é alguém com quem me identifico muito – e já está morta há anos. Não sou uma compositora prolífica, tenho de ter alguém a irritar-me ou a fazer-me feliz (não resulta tanto) para escrever. E normalmente não toco instrumentos, foi a minha primeira vez num estúdio em casa, pedi um teclado emprestado e pensei, vamos fazer isto, porque as palavras estavam a sair muito bem. Começava as 7 da noite e às 8 da manhã já tinha todas as músicas menos a primeira. Eu não queria lançar nada, queria saber se era capaz de fazer coisas.

O que deve ter em mente uma pessoa que oiça as tuas músicas?

T: Não sei… Porque sei que há tantas versões daquelas canções. A minha ideia inicial era lançar as demos sozinhas com o disco, para as pessoas fazerem a sua escolha. Como quando a PJ Harvey lançou as 4-Track Demos e o Rid Of Me. Ela lançou as demos para mostrar as diferenças entre como as canções começaram e como acabaram. Começaram como muito acústicas e acabaram como grandes cenas rock. Mas a editora não quis. E não devia ter deixado isso acontecer, porque a razão para eu ter separado os Tiguana Bibles foi para poder fazer as coisas à minha maneira e ver se resulta. Falhei nisso, portanto não sei mesmo o que as pessoas poderão pensar. Porque também ao vivo vai ser diferente do disco. E acho que ao vivo crio uma atmosfera boa e desta vez vou entrar mais pela electrónica, vou ter imagens no fundo e luzes. Espero que as pessoas fiquem com a ideia de que estou a fazer algo diferente. E tenho planos para fazer um álbum com outras pessoas a ajudar, como os Dead Combo, que aceitaram tocar em algumas músicas… e Mazgani, e os A Jigsaw… Quero fazer um álbum à Tom Waits, forte, acústico. E tenho outro a caminho que é o oposto: é mais Depeche Mode/Violator. Não acho que tenhas de te fincar a uma fórmula. Os meus artistas favoritos mudam sempre de fórmula e eu sei sempre que são eles.

 

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