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Gisela João agiganta-se no Coliseu de Lisboa

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Gisela João agiganta-se no Coliseu de Lisboa

Para escrever sobre o concerto de Gisela João no Coliseu de Lisboa, começamos pelo fim. Já a caminho da rua molhada, ouvimos um inglês que tinha assistido ao concerto e comentava com a sua interlocutora nacional: «she’s so bouncy» (ela é tão saltitante), entre sorrisos, a resposta «ela é feliz». Foi isto, uma Gisela João sem medo nem vergonha dos sorrisos, que surgiram com a mesma facilidade com que arrancava as dores do peito em canções. Gigante, a Gisela que subiu ontem ao palco do Coliseu de Lisboa, e o tornou mais pequeno para todos os que a foram ver.

Em palco havia uma árvore, o nome Gisela João estava escrito em nuvens almofadadas, sob as quais se desenhava o mar pelo qual «todos caminhamos». Ainda antes de Gisela subir ao palco, já a ouvíamos o primeiro capítulo do diário de bordo que atravessou a viagem do concerto. A viagem, essa, parou nas várias estações da vida de Gisela João, desde que «era pequenina, até agora, que é gigante», disse. Com os músicos a quem chamou «meninos de ouro» – Ricardo Parreira na guitarra portuguesa, Francisco Gaspar no baixo e Nelson Aleixo na viola –  formavam-se os quatro elementos para que Gisela estivesse no seu habitat natural.

A intensidade que atravessa Gisela João quando canta o amor impressiona, mesmo que já saibamos que é com isso que devemos contar. Sem falhas ou floreados artificiais, sentimos por vezes que a voz e as dores que expulsa vão vencer o corpo que se move desesperado. Do desespero que Gisela João tão bem interpreta, «Meu corpo», de Beatriz da Conceição, «Labirinto», com letra de David Mourão-Ferreira, «Canção Grata», poema de Carlos Queirós, «Que Deus me Perdoe», e, claro, «Meu Amigo Está Longe», foram exemplos maiores, celebrados em ovação rendida, como quem aplaude o fim de uma tempestade. Resumindo, uma Gisela emocionada explica: «Isto mexe cá dentro».

Nem só de dor se faz o Fado de Gisela João, ao final de cada tema, o sorriso e os saltos de felicidade da cantora enchiam a sala. Gisela era genuína no discurso ora mais sério, ora mais deliciosamente atrapalhado, de agradecimento a cada um dos membros da sua equipa, e na forma como contava as histórias que a acompanharam, e a própria pedia a quem a ouvia para cantar, bailar, e abanar-se. No Coliseu, a cantora falou como se estivesse a contar histórias num jantar de copos, e tornou a sala mais aconchegante. «Senhor extra-terrestre», de Amália Rodrigues, o «Fado Triplicado» que trouxe o São João do Porto a Lisboa pela letra de Capicua, ou mesmo a «Casa da Mariquinhas», trouxeram a mesma Gisela espalha-brasas que surge sempre entre as canções.No final, ainda antes do encore, o Rancho Folclórico de Barcelos subiu ao palco, e ficou até «Valentim», que fechou de vez o concerto. Antes desse final, o extraordinário «Madrugada sem sono» trazia um dos melhores momentos da actuação, e «Ser Fadista» arrancou uma das muitas ovações da noite, em aplausos concordantes com a frase «não é fadista quem quer, mas sim quem nasceu fadista».

«Na mala, levem o meu amor embrulhado com muito cuidado para não se partir, não quero cá corações partidos», dizia a voz de Gisela João no derradeiro diário de bordo do concerto em Lisboa, claramente sem saber da dificuldade que há em embrulhar corações tão cheios.


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