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Moonspell em entrevista sobre «Extinct»: «É um disco muito pouco ficcional»

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©Divulgação oficial

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Moonspell em entrevista sobre «Extinct»: «É um disco muito pouco ficcional»

Diz o ditado que parar é morrer, mas os Moonspell não precisaram de descansar para trazer a extinção. Mais de vinte anos depois do lançamento do primeiro álbum, a banda edita «Extinct», álbum que revelam ser «muito pouco ficcional». Com o álbum chegou o documentário «Road to Extinction», que junta a revelação do processo de criação de «Extinct», gravado na Suécia com Jens Bogren. Não foram só, no entanto, as portas para o mundo dos Moonspell que se abriram. A banda estendeu o documentário à explicação para as várias definições de extinção, e juntou a arte e a ciência se andassem sempre juntas. Se a extinção é o tema, é de criação que o vocalista Fernando Ribeiro fala ao MYWAY, em entrevista sobre o caminho até ao novo trabalho, e a estrada que falta percorrer.

 

Estão a lançar o álbum «Extinct», o que é que vos levou a ter esta ideia da extinção para o tema do trabalho?

Os discos dos Moonspell não são muito programados, até na altura em que começámos a compor o «Extinct» estávamos em negociações para ir ao Japão e à Austrália, e tínhamos muitas datas de tournée para fazer. Mas eu tinha uma história para contar, tinha eventos na minha vida…não sei tinha algo a dizer. Acho que os Moonspell até foram um bocadinho apanhados de surpresa quando eu disse, «vamos fazer um disco», mas passado alguns dias estávamos juntos a fazer o disco. O que é interessante é que a palavra «Extinct» é uma palavra pesada, com um conceito que toda a gente conhece, é uma palavra que eu utilizei, ou pelo menos que reaprendi, para dar algum significado a alguns eventos da minha vida, não são propriamente eventos de morte, também há eventos de vida. Eu percebi desde muito cedo, logo com este título, o processo da extinção. Claro, é o desaparecimento de alguma coisa – quando é uma extinção natural – mas temos de extinguir coisas de nós próprios para nos adaptarmos a outras situações. O fato de ser pai, que é uma experiência maravilhosa, a melhor experiência da minha vida, mas houve um deixar de ser um homem livre para passar a ser um pai, com toda essa responsabilidade. Este nome também teve um bocado a ver com sítios que foram esquecidos, pessoas que morreram, os nossos ídolos, principalmente morte do Peter Steel, dos Type O Negative, foi uma morte que nos bateu muito. É o fim de uma época, também. Eu sinto que (extinção) acaba por ser, também com as suas relações, com a extensão biótica, acaba por ser uma palavra bastante interessante para unir os dois muitos. Para unir a dor pessoal de um cientista quando perde uma espécie, ou nós quando perdemos alguém que representava uma época que não está lá. «Extinct» foi definitivamente algo para capturar o espírito de uma perda, mas também do que nós fazemos para capturar essa perda. Acho que essa luta está muito presente no disco. Nós só conseguimos observar a extinção quando ainda temos vitalidade.

 

Acho que o «Extinct» vai ser muito menos de época do que o Alpha Noir.

 

 

A noção de extinção tem, então, mais a ver com as histórias que contam no disco do que propriamente com o arrancar de uma nova fase dos Moonspell?

Não sei, há uma certa ambiguidade. Nós fechámos mais um ciclo com o «Alpha Noir/Omega White», que era quase um compêndio da nossa música. Foi muito interessante fazer aquilo como compositores, mas havia limites estéticos mais definidos, um álbum era Alpha, o outro Omega. Com o «Extinct» nós queríamos fazer…tentámos uma obra musical em que havia sem dúvida uma liberdade, uma disposição para estarmos completamente alheios ao estilo. Foi um disco que assumimos muito enquanto músicos, e não houve mais nada até regressarmos da Suécia. Os Moonspell também nunca pararam para pensar, ou para recomeçar. Não somos esse tipo de banda que esteve ausente durante uns tempos e depois voltou, portanto é-nos quase impossível fazer esse pensamento: ‘olha, é um recomeço’. Acho que há muita novidade, há pelo menos um avançar – pensamos nós – em sentido ascendente. É muito mais isso que nos interessa, uma certa expansão da nossa letra, das nossas músicas, de quem somos também. É um disco muito pouco ficcional, tem muitas perguntas, muitas respirações, tem uma assinatura muito mais pessoal nesses termos. Como tal, o que estamos vamos fazer em termos musicalmente, claro que vai ter aspetos que são novos. Nem faz sentido para nós pegar no que restou do outro disco, ou no que ficou por dizer. Acho que os discos dizem o que têm de dizer naquele tempo, e naquele espírito. Depois, há discos que vão ser mais duradouros. Acho que o «Extinct» vai ser muito menos de época do que o Alpha Noir…há discos assim, nós nem sabemos muito bem explicar o processo, mas é impossível fazeres isso sem tentar uma renovação.

 

 

Esse tipo de conceitos surgem ainda antes das canções, sabem logo que ritmo vai seguir o trabalho seguinte?

Falamos sobre isso, como bons portugueses tudo nasce de uma conversa, de um pequeno debate. Nós queríamos sem dúvida fazer algo mais melódico, algo mais desafiante em termos musicais. Claro que as ideias são sempre abstratas. Há sempre um manancial de coisas que nós temos. Isto agora soa um bocado presunçoso, mas nós adoramos a parte criativa. O que gostamos mesmo nos Moonspell é a criatividade, e isso mantém-nos muito juntos enquanto banda, resolve muitos problemas também. Quando ouvimos as primeiras maquetas do «Extinct» sabíamos que era um disco especial, não sabíamos explicar porquê…mas foi um processo de composição diferente. Por exemplo, a voz entrou logo muito cedo no processo. Tínhamos dois ou três riffs, e eu arranjava logo linhas de voz porque tinha várias ideias. Eles tinham a música, mas faltava-lhes um bocado a direção, e são um bocado esses os papéis que temos na banda. Eu chego ali está tudo sossegado, e eu vou agitar tudo. Nunca se começa verdadeiramente do zero, mas sem dúvida que neste processo as coisas foram acontecendo. Foi um álbum que nós começámos a compor seriamente há nove meses apenas, e há seis meses foi tipo um trabalho diário, não me lembro de nenhum dia que a gente não tenha trabalhado de noite. Foram 35 dias para o gravar, foi um longo tempo em estúdio, mas este disco precisava desta paciência, deste tempo, deste cuidado.

 

Acho que quando os Moonspell pararem vai ser de vez.

 

 

A ideia com que se fica é que os Moonspell nunca param, e deram muitos concertos mesmo durante o ano passado. Como é que conseguiram equilibrar isso e a criação do novo trabalho?

É a dinâmica da nossa banda, é uma dinâmica também de alguma necessidade. Hoje em dia, para uma banda portuguesa como nós é impossível manter a continuidade fazendo uma tour e ficar um ano sem fazer nada. Isso não existe. Claro que podíamos de alguma forma tirar mais férias, ou mais tempo, mas lá está, há sempre qualquer coisa importante para fazer, sempre qualquer coisa urgente para dizer, por isso temos uma dinâmica de nunca parar. Acho que quando os Moonspell pararem vai ser de vez. Nós também sabemos perfeitamente que isto não acontece todos os dias a uma banda portuguesa. É um privilégio para o qual temos de trabalhar muito mais. As pessoas dizem: «ah, no ‘Wolfheart’ estavam muito mais ocupados»…não. Nunca estive tão ocupado como agora. Não há nenhum momento da minha vida, nenhum lançamento de disco em que eu estivesse tão ocupado, ao nível de nem conseguir comer! (Risos) Isso é bom sinal, é sinal de vitalidade para a banda, mas nós só pensamos que realmente nunca parámos quando as pessoas nos perguntam. Há muita coisa a acontecer, vamos estar na estrada até dezembro de 2016, pelo menos. Nunca parámos, nem vejo que vamos parar. A criatividade não é o problema, o resto temos de o fazer, e gostamos de o fazer. É um compromisso que não dá para fazer um ano sabático para escrever as letras. Essa parte de criação artística sossegada tivemo-la na Suécia, porque fugimos um bocado da nossa vida quotidiana para estarmos concentrados no disco. Não íamos pensando em muito mais coisas, Portugal estava longe, nós lá tínhamos de fazer disco.

 

 

Vocês trabalharam com o produtor Jens Bogren, o que é que ele trouxe ao vosso som?

Trouxe muita coisa. Trouxe exatamente aquilo que nós queríamos quando contratámos o Jens, que é um profissional, tem uma lista de clientes que inclui Kreator, Opeth, Arch Enemy, portanto sabíamos que íamos trabalhar com um profissional muito exigente, mas foi um tiro no escuro que acertámos em cheio. Ele dedicou-se de uma forma pessoal porque a apanhámos numa encruzilhada enquanto produtor. Ele estava farto de fazer metal mais agressivo, metal muito efetivo mas com menos que dizer, e apanhou os Moonspell com o «Extinct», com o conceito, com as letras, com a parte pessoal, e foi ótimo para ele. Portanto, ele trouxe mesmo mesmo muita coisa, não só o profissionalismo…eu disse-lhe que queria um disco que não fosse muito produzido, natural, um com som cristalino mas poderoso, e foi isso que ele fez à maneira dele, claro, ainda muito melhor do que eu imaginava que ele fosse fazer. Depois envolveu-se pessoalmente, o que para os Moonspell faz sempre toda a diferença. Houve muita conversa sobre as letras, houve muito tempo em que estivemos ali à espera para ter a atitude certa, para gravar o take certo, daí esse tempo todo em estúdio. Como vocalista, foi o produtor que mais chegou perto de mim enquanto performer. Eu não me levantava e ia logo gravar, falava com ele, ficávamos ali horas e horas a discutir letras. Depois ia cantar, e corria muito melhor. Eu gostei muito desse processo. Foi sem dúvida um produtor que trouxe outra qualidade à nossa música. Nós acreditamos que uma banda não é uma ilha. Estar numa banda há 23 anos não é saber tudo, e nós, no Jens, encontrámos alguém que nos podia ajudar a chegar a outro nível, e a no que diz respeito à produção não havia nada que eu mudasse.

 

 

É por este disco mais pessoal que quiseram fazer um documentário? Para dar um contexto às canções?

Nós queríamos fazer isto. Não que tenhamos uma grande necessidade de aparecer, mas hoje em dia as editoras – foi também uma consequência positiva da crise e dos downloads – tentam sempre ter um disco com material bónus para as pessoas, e nós pensámos em fazer um documentário, uma coisa completamente modesta, de 20-30 minutos. Entretanto levámos o Vítor para a Suécia – decidimos não fazer nós com os telemóveis e com as GoPro – e ele realmente conseguiu construir uma narrativa do que é para os Moonspell fazer um disco, o que é a adaptação de uma banda portuguesa que vai para a Suécia, e tem de conviver com aquilo tudo. Fizemos este documentário também porque ajuda a contar a história não só no nosso disco, mas também de quem nós somos. Acho que é um documentário que permite ao fã entrar na nossa sala, coisa que não permitiríamos de verdade (risos). Uma das melhores coisas que aconteceu ao «Extinct» foi termos este documentário, porque acrescenta algo ao disco. Acrescenta o processo, acrescenta a discussão sobre a música, e isso está muito bem descrito, o documentário tem uma narrativa muito própria. O Vítor Castro fez um excelente trabalho, e foi ótimo termos conseguido isto nesta altura, porque também apanha a banda numa altura muito especial, e é uma coisa muito natural. Em boa hora isto se tornou um filme, e não uma coisa de vinte minutos.

 

 Sempre detestei essa ostentação, esse facto de termos de aparecer com roupas melhores porque somos artistas.

 

Não vos interessa, então, manter o mistério do processo?

Se nós fossemos os Sister Of Mercy, ou uma banda dos anos 80, acredita que éramos as pessoas mais misteriosas do mundo, e se calhar não partilharíamos tanto com os fãs. Mas vivemos outros tempos, e não caindo no exagero de que tudo o que nós fazemos ser alvo de um post nas nossas redes sociais – não gosto nada disso – para mim o que é importante é um bocado desmistificar o que as pessoas, especialmente os fãs das novas gerações, pensam dos músicos, que é: chegar ao hotel, ter um chef, ter ali uma mordomia, e tal…não. É uma vivência muito mais normal, e eu sempre gostei de mostrar isso. Principalmente em Portugal, quando eu chegava com o meu carro velho a um sítio qualquer, via um ou outro artista e que tinha um grande carro e que se calhar se empenhou bastante…eu sempre detestei isso, sempre detestei essa ostentação, esse facto de termos de aparecer com roupas melhores porque somos artistas. Para mim o que me interessa não é expor a nossa privacidade, é que as pessoas tenham alguma noção da realidade do que é estar numa banda, e muitas vezes não têm. Esse misticismo eu manteria, mas é uma luta completamente inglória, e já que nos vamos mostrar, vamos mostrar-nos a partir de uma ideia nossa, que não é controlada, não tem guião, mas que mostra muito mais o que é a verdade do que é fazer a nossa música. Nem toda a gente é os Metallica, e há mais bandas parecidas com os Moonspell do que com os Metallica.

 

Então não se sentem outsiders, sentem que há muitas bandas que vivem e trabalham de forma semelhante à vossa?

Sim, mas há muitas bandas que fazem demais, eu prefiro fazê-lo num documentário do que estar todos os dias a meter coisas tipo: ‘olha agora fizemos um riff’, ou ‘agora vamos juntar dinheiro para a banda ir não sei onde’! São tudo coisas às quais vou ter de me adaptar. Sentimo-nos um bocadinho outsiders porque somos um bocadito «nabos» nas coisas das redes sociais. Também sabemos que nem tudo lá está, há fãs nossos que nem sequer têm Facebook, e Instagram, e vão aos concertos todos, e estão informados. Sabemos que temos de partilhar, sabemos que é uma regra do jogo, mas preferimos partilhá-lo numa obra tipo um disco, ou um documentário, ou um disco. Todos nós já tirámos selfies, e fizemos essas coisas, mas nós tentamos ter uma coisa mais vasta, definitivamente.

 

Com tantos anos de carreira, os Moonspell atravessaram muitas mudanças. Conseguiram adaptar-se a todas?

Não, como é óbvio há coisas que não conseguimos fazer, e há coisas que recusamos fazer. Tentamos sempre estar adaptados. É um bocado como as drogas, não estar dependente deste ou daquele canal, desta ou daquela coisa. Para nós a prioridade é a nossa música, e tudo o resto são consequências que orbitam a nossa música. Como tal, temos algumas dificuldades a adaptar-nos a algumas coisas, e gostamos de fazer as coisas de forma mais tradicional, mas também sabemos que não podemos ser o tipo de banda congelada no passado, e estar à espera que os fãs estejam à espera numa loja de disco para comprar o nosso disco. Gostávamos que isso acontecesse? Definitivamente, mas estamos em 2015 e sabemos que isso perfeitamente que isso não vai acontecer.

 

Como é que este trabalho vai ser levado ao palco?

Com o mesmo espírito do disco. Ou seja, claro que o repertório do «Extinct» vai ser muito importante – já tivemos a testar no nosso estúdio a tocar ao vivo, mais complicado para nós, tenho de mudar a minha maneira de cantar toda – mas também vamos investir muito no espetáculo. Queremos fazer um espetáculo grandioso, mostrar coisas às pessoas, as pessoas saírem do espetáculo e dizerem: «Eh pá, os Moonspell meteram mesmo esforço, investiram mesmo neste espetáculo, não vieram fazer só mais outra data». Vai ser assim, um bocado «larger than life». Estamos com mais produção em todas as datas. Claro que a produção não interessa nada se não tivermos um bom concerto e um reportório também. O «Extinct» vai ser uma boa fatia do nosso concerto, mas também vai ter o «Wolfheart», que faz vinte anos…portanto vamos ter um concerto longo, sempre entre 90 minutos e duas horas. Acho que vai ser uma tournée ótima. Estamos muito entusiasmados em tocar este disco ao vivo. Estamos sempre, mas desta vez mais um bocadinho ainda. Vai ser diferente do «Alpha Noir», se calhar não vamos ter mosh pit, vamos ter pessoas a cantar, e estamos curiosos para ver isso.


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