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Banda do Mar: «Nem o disco é uma pintura do que somos hoje em dia, nem foge a isso»

Banda do Mar
©Divulgação oficial

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Banda do Mar: «Nem o disco é uma pintura do que somos hoje em dia, nem foge a isso»

«Tanto Mar» é o que separa Portugal do Brasil, dizia Chico Buarque. Em 2014, Mallu Magalhães, Marcelo Camelo, e Fred Ferreira abraçam-no e encurtam-no com a Banda do Mar. O resultado é um álbum a transbordar felicidade, e que segundo os próprios reflecte uma mudança de ciclo proporcionada pela chegada de Mallu e Marcelo a Portugal. A duração do ciclo novo é uma incógnita, e não se sabe se haverá mais discos. Para já há um álbum homónimo que «era para acontecer mesmo», e é dele que aqui se fala.

 

«A mudança de cidade é sempre muito convidativa, faz sempre com que a nossa criatividade seja activada. Acho que esta é uma manifestação de início de ciclo» – Mallu Magalhães

 

MYWAY: Vocês já se conhecem há vários anos, conforme já têm falado em várias entrevistas. Qual é que foi, então, o ponto de partida que vos levou a decidir que estava na hora de formar uma banda?

Marcelo Camelo: Foi meio progressivo…Acho que é até curioso de lembrar porque indica como era pra acontecer mesmo, porque não precisámos de dizer: ‘olha pessoal, tive uma ideia, vamos fazer isto’…A gente foi cozinhando isso aos poucos. O facto de não termos precisado de um grande contrato, indica que era para acontecer mesmo. Acho que fez parte de um movimento maior, que foi eu e a Mallu termos vindo mais para cá para perto, para perto do Fredinho…O negócio foi um pouco consequente de um monte de outras coisas.
MYWAY: Essa chegada a Portugal, para além de influenciar o facto de a banda se lançar, também influenciou de alguma forma o som da Banda do Mar?

Mallu Magalhães: Eu acho que sim, né? Acho que a mudança de cidade é sempre muito convidativa, faz sempre com que a nossa criatividade seja activada. Acho que esta é uma manifestação de início de ciclo. Todo o início de ciclo carrega novas referências, novas demandas, novas necessidades de contraponto, e eu acho que para além da própria cidade, o facto de ser um novo ciclo altera muito o som.

 

«A nossa união durante este ano reflecte-se naquelas canções assim mais iluminadas, ou ensolaradas» – Fred

 

MYWAY: Embora seja um novo ciclo, as letras das canções demonstram uma felicidade muito plena. Isso é um retrato das vossas vidas actualmente?

Marcelo Camelo: É tudo mentira! (entre risos)

Fred e Mallu: É tudo verdade!

Marcelo Camelo: As letras e as composições, o nosso jogo de intenções ali é de alguma forma tentar espelhar a nossa amizade, o nosso inconsciente, mas muitas vezes é projectado em outros objectos, em coisas que você vê no outro. É um jogo que a gente gosta de entender como mais fluido, menos chapado na compreensão. Nem o disco é uma pintura do que nós somos hoje em dia, nem foge a isso.

Fred: O sentimento que aquela música me traz, a canção e a letra têm esse lado mais alegre, e eu digo que reflecte o nosso estado quando estamos juntos. Claro que há montes de coisas que nos deixam alegres, mas a nossa união durante este ano reflecte-se naquelas canções assim mais iluminadas, ou ensolaradas.

MYWAY: Essa união que vocês têm facilita ou dificulta na hora da composição?

Mallu Magalhães: A nossa composição é simples, porque eu faço as minhas, o Marcelo faz as dele, o Fred dessa vez não contribuiu com nenhuma, mas a composição é íntima e solitária, no nosso método. Na criação da música, na construção (que também é composição) acho que a nossa união só contribui, porque a gente tem muito amor um pelo outro, e esse amor resulta em aceitação, nesse desejo de que o outro esteja feliz, né?

Marcelo Camelo: No caso da banda, acho que o que acontece é que a partir do momento em que a gente olha um para o outro e diz: ‘vamos fazer esse negócio? Vamos’, o nosso olhar, as nossas selecção de coisas, as nossas energias, passam a virar-se para isso, que é um encontro. A presença do outro está ali, na escolha das palavras, para onde é que vai aquele acorde…tudo isso, passamos a fazer mirando na banda. Para mim, dá para sentir bem essa diferença, porque eu já estava há um tempo fazendo o oposto, a fazer o trabalho solitário, e aí você fica ali com os seus interlocutores pessoais a tentar encontrar uma resposta para aquele caminho…Com a banda, as figuras para quem você está fazendo estão ali, dá para encostar. Acho que mesmo no momento da composição, a gente sente muito a presença um do outro.

«Nem o disco é uma pintura do que nós somos hoje em dia, nem foge a isso» – Marcelo Camelo

MYWAY: Fred, tu tens estado associado a vários projectos que não têm nada a ver uns com os outros. A Banda do Mar é muito diferente de 5-30, que também são diferentes de Orelha Negra, ou Buraka Som Sistema. Isto também reflecte as tuas influências?

Fred: Sim, eu sou um estudante de música, no sentido em que procuro estar actualizado no que está a ser feito, e no que já foi feito, mas que eu não conheça. Gosto de música boa desde aqui até ali. Por isso, gosto de música electrónica, gosto de hip-hop, mas gosto de rock e canções – com o meu toque de telemóvel, espero que ele não toque, mas se tocar vais ver que o meu gosto é variado. Eu gosto de fazer coisas boas, e de desafios, e para mim ser desafiado, ou desafiar alguém para fazer algo que não tenhamos feito, e que te ponha a pensar mais ainda, acho que é sempre positivo. Desenvolve-te enquanto músico e enquanto pessoa poderes fazer coisas diferentes.

Marcelo Camelo: Com certeza que o Fred que toca hoje com a gente não é o mesmo músico que era antes dos 5-30, antes dos Orelha Negra, o mesmo para a Mallu com a carreira a solo, e eu com as minhas experiências. A gente tem pensado muito sobre isso, porque temos sido questionados sobre a possível longevidade da banda, onde é que vai dar, e tal…a gente já faz há algum tempo, e tem essa intuição de que os tempos mudaram, sabe? Antes pensava-se nessas coisas como definitivas, para sempre. De repente, por um olhar ainda regido pelo paradigma antigo pode parecer que o Fred faz milhões de coisas. Uma pessoa uma vez perguntou-me assim: ‘como é que você tem tempo para administrar tantas coisas; o DVD, a promoção do disco da Mallu, o disco do Wado…’, eu respondi que no fundo me sobra muito tempo, eu gostaria de ocupar muito mais tempo com o trabalho. Acho que os dias actuais são mais afeitos a essa multiplicidade, acho que é mais normal que um artista se divida entre projectos diferentes, e que encontre esses projectos quando for conveniente a todas as partes. Acho que é mais comum hoje em dia do que foi numa certa época. Mesmo eu com os (Los) Hermanos, a gente parou há uns oito anos, era uma coisa mais ‘Meu Deus!’. Hoje você vê que as bandas respiram, é normal, no mundo inteiro você vê isso.

MYWAY: Isso também tem a ver com a mudança na forma como as pessoas ouvem música, o facto de poderem e ouvirem muito mais coisas?

Marcelo Camelo: É, pulverizou um pouco sim. Dantes era mais concentrado. Tinha essa ideia da gravadora e do mercado, e dentro de todas as bandas que existiam, eram pouquinhas as que passavam pelo funil, e isso era divulgado de uma forma mais vertical. Agora tem um público mais horizontal, e cada um gosta um pouco deste, um pouco daquele, e exige, e permite ao mesmo tempo, que os artistas participem de coisas estéticas mais variadas.

MYWAY: Vocês gravaram grande parte deste álbum nos estúdios «iá», que também tem contribuído bastante para uma troca de colaborações entre Portugal e o Brasil. Sentem que esse intercâmbio entre países vai continuar a aumentar, ou ainda não é um território assim tão explorado?

Mallu Magalhães: Acho que a tendência é ter cada vez mais troca, ainda por cima os vôos têm ficado cada vez mais acessíveis, as pessoas têm viajado cada vez mais…Eu acho que realmente vai ter cada vez mais troca. Eu espero que isso aconteça, porque Portugal é um país incrível, e o Brasil é um país incrível também. São culturas irmãs, e que têm muito a trocar.

Marcelo Camelo: Essa coisa da Internet e do acesso à informação mundial deu uma nivelada, todo o mundo que gosta de música independente e alternativa, tem um espaço para a linguagem que se assemelha um pouco mais. Facilitou as pontes. Quando eu era mais novo e comecei a acompanhar a cena que chamávamos de underground – pelo menos era o nome que a gente dava no Brasil às bandas que não eram famosas, que não eram de rádio – para você conhecer uma banda de outro estado brasileiro, tinha de comprar a única revista que saía, que tinha uns anúncios pequeninos, mandar uma carta para o cara, metias dinheiro na carta, o cara te respondia com uma cassete demo, e se quisesses mostrar para outra pessoa, tinhas que fazer uma cópia dessa cassete, e a qualidade ia sempre piorando. Eu lembro-me de ter interesse por essa cena que não era a principal, dos Estados Unidos, e ser quase uma militância para acompanhar, tinha que participar no exércitozinho do underground. Hoje, essa cena Indie é mais um seguimento dessa esfera de coisas. Tem os grandes artistas mundiais, e a cena indie, os artistas que se comunicam com essa linguagem, e tentam fazer uma música mais inventiva. Então, acho que essa facilidade de comunicação é intercontinental, e mundial. A cena inglesa com a cena brasileira também tem mais contacto do que tinha há dez quinze anos.


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